25 de outubro de 2010

born to be...?

Eu cresci ouvindo "para ser mulher, tem que ser bonita e, para ser bonita, tem que sofrer". Então é isso, estamos aí, sofrendo desde 1981, sofremos bem, para sofrer sempre! Faço unha toda semana, corto o cabelo, uso creme para dar volume, faço depilação, sorrio, uso curvex com carro em movimento, passo máscara nos cílios para deixar o olhar marcante, hidrato a pele, faço esfoliação nos pés para mantê-los macios, passo batom, passo lápis nos olhos, durmo de batom para hidratar os lábios, passo creme nas mãos, mas não é o bastante. Nunca é, sabe?

Hoje eu estou usando um esmalte azul [lindo] e uma mulher logo cedo me disse: “menina, homem não gosta de esmalte assim” ah sei, e? “e desse jeito, você não arruma ninguém”. Eu poderia responder, aliás, deveria ter respondido “e desde quando quero um homem que acha que a cor do esmalte que eu uso é mais importante que eu?”, mas óbvio que a tchonga aqui falou “ah, tá” e só.

Então, está bem. Desde quando o negócio é agradar pelo exterior [desde muito tempo, eu sei], mas alguém aí vê essa preocupação nos homens? Eu nunca vejo os caras falando, por exemplo, “não vou usar mocassim porque as mulheres não gostam”. Eles apenas usam, se a mulher gosta ou não, problema dela. Eu gosto dessa ‘força’, gosto dessa atitude nos homens.

Eu não sou contra a vaidade feminina, não mesmo. Mas sou contra a massificação do que é bonito, que deixa as mulheres com cara de quem saiu de uma linha de produção, todas em moldes e desesperadas para tirar qualquer rebarba que fique e, sobretudo, essa necessidade de agradar ao sexo oposto.

Eu juro que tento com todas as forças não me apegar a todos os conceitos atuais de beleza, que tento não me deixar consumir por não ser o padrão, que tento não pirar e fazer uma lipoaspiração no meu cérebro e quase todos os dias eu consigo desviar dessa neurose coletiva em fazer parte do coletivo feminino. Mas como não vou queimar meu sutiã na Avenida Paulista, vou deixar meu manifesto aqui.

Quero mandar para a merda todas as pessoas que não conseguem ver além do óbvio, além da merda de um cabelo liso sem graça, que não conseguem ver além de uma barriga tanquinho, que não se interessam por nada além de uma frase pronta e que não conseguem lidar com nada que seja diferente, inclusive um esmalte azul.

As meninas crescem ouvindo uma porção de coisas que vão moldando o que elas são. Daí a frase “Ninguém nasce mulher. Torna-se mulher”, pois é, ninguém nasce esse poço de referências sobre o que é bonito, sobre o que é aceitável, sobre como uma mulher deve ser. Ninguém nasce achando que será infeliz se não pesar 40 kg ou achando cabelo enrolado feio, sabe? Ninguém nasce assim. A fragilidade das mulheres não está na ausência da força física, mas na pré-disposição histórica em se moldar naquilo que não si mesmas. Think that.



“Ninguém nasce mulher: torna-se mulher. Nenhum destino biológico, psíquico, econômico, define a forma que a fêmea humana assume no seio da sociedade; é o conjunto da civilização que elabora esse produto intermediário entre o macho e o castrado que qualificam de feminino. Só a mediação de outrém pode constituir um indivíduo como outro.” (Beauvoir, Simone)

2 comentários:

Anônimo disse...

Mila ...

Muito bom ... muito bom mesmo !!!
Adorei o manifesto !!!

Beijos ...

M.

Janaína Pupo disse...

Essas palavras me fizeram bem e é isso aí, o cara não deixa de usar isto ou aquilo por nossa causa.
Esse negócio de "seguir padrão" é de tirar do sério, cansa!
Muito bom o manifesto, adorei.

Beijos!